terça-feira, 9 de junho de 2015

Tempo para o livro, o vestido e o amor

Há tempo para todas as coisas... Para nascer, crescer, morrer. Arar a terra, lançar as sementes, cultivar, ver os primeiros brotos, colher os frutos e fazer a poda. Uma lei universal, conhecida pelos antigos e sábios, compartilhada a cada geração com o o intuito de tornar a vida mais leve.

E quem consegue colocar em prática esse ensinamento? Diante do imediatismo dos nossos dias, a pressa desregrada do agora, a ânsia em ter tudo pronto pra ontem, geram uma ansiedade gigante capaz de desestabilizar e acabar com a saúde de qualquer ser humano. 

Discuti o assunto com um grupo de amigos que, assim como eu, têm a impressão que os ponteiros do relógio correm mais rápido que o normal, impulsionados pela cultura do "quero agora" somado a Síndrome do Pensamento Acelerado (SPA) - conceito criado pelo psiquiatra Augusto Cury que define a hiperconstrução de pensamentos, numa velocidade tão alta que estressa e desgasta o cérebro. 

Em nossa conversa, refletimos como a ansiedade nos atinge, e quais os caminhos para superar esse martírio moderno. Em geral, optamos por aprender na dor, após muitas crises de ansiedade, noites mal dormidas, falta de apetite ou vontade compulsiva de comer, gastrites, e até úlceras. Para cada um, a experiência pessoal, seja escrever o primeiro livro, encontrar o vestido de noiva ideal, lançar o projeto de uma revista, e entender o tempo de maturação do amor, requer o aprendizado de respeitar e colocar em prática o tempo certo para todas as coisas. 

Atelier que fará o vestido ideal - Foto: Silas Macedo
Um dos amigos, hoje um jovem e promissor escritor, sofreu ansioso ao pensar em seu primeiro livro em 2011, o escreveu em 2012, e o lançou em 2013. Segundo ele, foi o tempo certo de amadurecimento das ideias, e o lançamento da publicação aconteceu na melhor data. A outra, ansiosa por achar o vestido ideal para o casamento - importante rito de passagem - comprou o errado na primeira loja que entrou. Arrependida, respeitou os desígnios do tempo, e após um período, encontrou exatamente o que buscava, com direito aos mimos e todo o respeito que as noivas merecem. O projeto da revista, almejado para março, concretizou-se em junho. E o amor tão aguardado, aconteceu, após entender que o ele é uma via de mão dupla, que depende da disposição e o tempo de cada um.

Ao final, o consenso de que o conselho dos sábios, mestres e filósofos em respeitar o tempo de todas as coisas, sempre esteve certo, e quando praticado é a melhor forma de tornar a vida mais calma e plena. Um exercício difícil, a ser aplicado diariamente.

Silas Macedo

domingo, 31 de maio de 2015

Adversidade, Formiga ou Monstro Gigante? Depende do ponto de vista

Tudo depende do ponto de vista! A vida nos dá diariamente a oportunidade de encará-la com mais positividade. Diante das adversidades, sejam elas, a perda de um emprego, o término de um relacionamento, a morte de um ente querido, e até a picada de uma formiga no dedão do pé, a diferença é como lidar com elas. 

Fato que um problema é sempre um problema, mas deve ser encarado como desafio e, principalmente, como oportunidade de aprendizado. Mas como fazer isso? O primeiro passo é tirar todas as lentes de aumento - geralmente fazemos uso delas, tornando a situação ainda mais dramática - do foco da situação. Exemplo simples, ao olhar uma pequena formiga com este tipo de lente, ela vai parecer um monstro gigante capaz de devorar tudo e todos. É necessário encarar a situação de forma que ela realmente é, nem mais e nem menos.

Perdi meu emprego "estável", e não sei o que fazer! Não está aí a oportunidade de fazer algo novo? Mudar de área, fazer algo mais prazeroso. Terminei meu relacionamento, e estou curtindo fossa! Será que o relacionamento estava realmente bem? Um ente querido desencarnou, a dor e a saudade são gigantes, mas faz parte do ciclo da vida, e é um aprendizado necessário a todos.

O mote de uma adversidade é que ela nos tira da zona de conforto. E quem gosta de ser incomodado? É tão bom estar quieto e aconchegado. Mas a vida é movimento. Arrisco a dizer que ela detesta pó, energia parada, e todas as quinquilharias que nos apegamos sem necessidade. A vida vem para mexer, nos levar adiante.

Quem nunca conviveu com pessoas que reclamam o tempo todo? Ao lado delas, a energia baixa, e os fardos parecem ser mais peso do que realmente são. Há uma clara diferença de comportamento quando somos acometidos por qualquer adversidade. Afinal, há sempre o susto, o tempo para pegarmos fôlego, raciocinar, e seguir em frente. Por isso, uma atitude positiva sempre faz a diferença.

Há quem diga: Falar é fácil, quero ver é colocar na prática o tal positivismo. Advirto que não é fácil, mas o hábito faz a diferença. Quando for tomado por um pensamento ou atitude negativa, se policie, mude os polos, e aproveite o melhor da vida.

Silas Macedo

domingo, 26 de abril de 2015

Água Saborizada: Chique, Leve e Gostosa

Já tinha provado as águas saborizadas em alguns restaurantes e eventos, os líquidos vistosos que mesclam a transparência e a leveza da água, com os sabores sutis de ervas, frutas e legumes. O primeiro contato é o visual, bonito, salta aos olhos. Depois o olfato, por meio do leve aroma que antecede a gustação. E por fim, ao beber, é fácil perceber porque as águas saborizadas fazem tanto sucesso. Gostosas, leves e saudáveis!

Depois do primeiro contato, somado a necessidade de optar por bebidas mais saudáveis e diminuir o consumo de refrigerante e sucos industrializados, optei por conhecer um poucos sobre as águas saborizadas - o nome dado a esta bebida pode variar, alguns restaurantes especializados ou sites de gastronomia e saúde usam flavorizada ou aromatizada - e, principalmente, começar a bebe-la.

A primeira experiência foi simples, fiz duas opções, uma com hortelã e limão e outra com manjericão (colhido no quintal de casa). Coloquei a primeira em uma jarra e a segunda em uma garrafa de vidro, ambas com água gelada, para repousar na geladeira. Antes da refeição, coloquei as bebidas sobre a mesa, causando uma impressão que misturava surpresa e desconfiança. Com perguntas nas entrelinhas como: Bonito, mas será gostoso?

Para a surpresa de todos, as águas ficam super saborosas! Desde então, tenho diariamente optado por elas, sucos naturais e chás ao invés de bebidas industrializadas, durante as refeições, lanches ou simplesmente para matar a sede e hidratar o corpo.

Já testei algumas e quero provar outras. Acredito que para fazer uma boa água saborizada, basta ter bom gostos e ser um apreciador de sabores e aromas. A dica é misturar no máximo dois itens a água, porque mais do que isso perde-se as identidades gustativas e há o risco de virar uma bebida "tutti-fruti". Outro quesito importante, é lembrar que água saborizada não é suco ralo e muito menos uma bebida insossa, por isso é importante calcular bem a medida de água e ingredientes adicionados.

As águas saborizadas além de refrescantes e bonitas aos olhos também são fonte de vitaminas, não têm açucares, e tem propriedades antioxidantes, diuréticas, e desintoxicantes. Pode-se usar laranja, morango, manga, carambola, romã, abacaxi, hortelã, limão, pepino, manjericão, capim-limão, canela em pau, anis-estrelado, cravo, gengibre e rosas (use sempre pétalas da mesma cor).

Separei algumas sugestões associados a suas benfeitorias:

* Água com laranja e alecrim - rico em ferro, cálcio, vitamina E e B6, betacaroteno, diurético e antioxidante e antiinflamatório. Contribui com o funcionamento do fígado, reduz açucares no sangue, e alivia sintomas da TPM;

* Água com abacaxi e gengibre - digestivo, estimula o metabolismo, e alivia gazes e azia;

* Água com pepino, limão e hortelã - com funções detox (desintoxicante); 

* Água com romã e alecrim - antioxidante, combate o colesterol LDL ("ruim"), e devido a adição da romã combate a formação de coágulos no sangue.

Espero que gostem!

Silas Macedo

domingo, 19 de abril de 2015

Navegar é preciso, mas sem excesso de bagagem

Navegar é preciso! A frase de grandes navegadores adotada pelo poeta Fernando Pessoa é a que melhor define o desejo de ampliar horizontes, seja por mudanças ou viagens. Toda vez que almejamos mudar uma situação em nossas vidas, romper com algo que não nos faz bem, um emprego, um relacionamento, ou qualquer outra coisa, é necessário se desapegar de sentimentos, comportamentos, e tudo que possa ser considerado como excesso de bagagem.

Assim como nas viagens que é imprescindível não levar bagagens demais, pelo simples de fato de não pesar durante a caminhada e deixar espaço livre nas malas para ser preenchido como presentes, memórias e tudo de bom que a viagem possa proporcionar. Também deve ser as mudanças, ou então, por escolha, pagar pelo excesso de bagagem e continuar com os mesmos cacarecos na mala.

Viajar ou abandonar algo que não queremos em nossas vidas requer o exercício do desapego. É preciso mudar de casa e, principalmente, de comportamentos e forma de pensar. Não adianta ansiar por novos ares e mudanças e levar consigo todos os hábitos ou toda a bagagem velha e mofada de sempre. Surge aí o desafio! Como praticar o desapego? A resposta é redundante, pela prática. Ninguém muda um hábito a não ser que persista. 

Sempre observo pessoas que desejam por mudanças, mas nunca estão dispostos a ela. Permanecendo em um ciclo vicioso, repetindo erros, dores, pensamentos, em altos e baixos emocionais. Por isso, ter consciência do que ser quer e onde chegar é o primeiro passo. Não adianta buscar o novo, sem saber ou ao menos vislumbrar que novo é esse. E se nesse processo de mudança, percebemos que não sabemos onde queremos chegar, nada de crises. O primeiro passo para encontrar o caminho é admitir que está perdido.

Sem pressa e nenhuma culpa, organize as ideias, encontre o caminho, estipule a rota, desapegue de tudo que não serve mais, faça as malas - praticando o desapego do excesso de bagagens, abandone as âncoras e raízes mortas, e siga rumo a novos mares ou estradas. E esteja pronto para abastecer as energias e arejar a alma.

E lembre-se: Navegar é preciso!

Silas Macedo

sábado, 11 de abril de 2015

Da sexualidade clandestina aos armários abertos

Falar sobre sexualidade foi por muito tempo algo proibido, sexo somente pra reproduzir, debaixo dos lençóis e na calada da noite. Mas para alívio de uma parte pensante da humanidade, as coisas estão mudando gradativamente, mesmo diante da resistência retrógrada de alguns. Ao olhar para a história é possível acompanhar as conquistas de homens e mulheres ao longo do tempo para viver seu sexo e sua individualidade.

E, nos últimos anos, o embate entre homossexuais - em todas as suas vertentes - e os heterossexuais - considerados "normais" - tem se tornado mais forte, embora velado. De um lado, um grupo aparentemente crescente, engajado, segue atento a todos os tipos de violência que sofreu e ainda sofre, e no outro, na contramão, um grupo formado por homens e mulheres conservadores, integrantes de mundo inconsciente, longe da empatia e do respeito, felizes em empunhar a bandeira de valores equivocados e distorcidos. 

Um desses grupos acompanho de perto, e isso não é novidade para ninguém. E, por este motivo, tenho ouvido relatos que começam com homens e mulheres que atualmente tem em média 50 e poucos anos, passando por quarentões, balzaquianos, jovens de vinte anos, até a Geração Y.

A começar pela história de um homem que apenas aos 60 anos decidiu viver sua homossexualidade, após um longo casamento heterossexual "feliz" com filhos, subordinado a normas e convenções. Segundo ele, a decisão resultou em uma avalanche de reações adversas, mas, principalmente, sua paz de espírito em não viver mais na clandestinidade e, a possibilidade de viver paixões tão intensas quantos as juvenis. 

Outro relato, é de um homem de 50 e poucos anos, que entendeu e decidiu viver sua sexualidade  aos 28 anos, no início da década de 80, onde ser gay era algo incompreensível, associado diretamente a AIDS, e as travestis e transformistas apresentadas nos programas do tio Silvio Santos. Ele me contou que, assim com tantos, ele tentou o suicídio, por achar naquele momento que a morte seria melhor que ser gay. Passada a crise, ele aprendeu a viver sua sexualidade, em meio a fantasmas, na calada da noite, juntos de outros como ele.  

Já os com 40 anos, tiveram crises parecidas, viveram sua sexualidade em meio a punks, góticos, fashionistas, sem nunca sair assumidademente do armário. Um deles em especial, me disse que nunca superou as piadinhas de mau gosto que teve de ouvir calado, e o medo constante de sofrer violências por um crime que não existe, e sem possibilidade de defesa. Dois dos homens e uma mulher dessas gerações, assim como tantos outros, tem um único pesar, jamais terem tido a coragem de assumir sua homossexualidade, principalmente, aos familiares, e hoje viverem ainda fadados à clandestinidade.

"Imagine levar seu sobrinho a um campeonato de futebol na escola, a convite dele, e no percurso vê-lo fazer piadas ofensivas a um garoto gay e ter de ficar calado. Qual seria a reação dele ao descobrir que o tio mais querido também é gay?" - desabafou.

As gerações passam, mas alguns embates são os mesmos. Ouvi relatos de amigos gays e lésbicas de 20 e poucos anos, que como as gerações anteriores tiveram medo, passaram por crises, mas decidiram viver sua sexualidade sem mentiras, a começar em casa. O susto é inevitável, afinal nenhum pai e mãe concebeu os filhos para serem "diferentes", para não dizer gays. Mas será que esses filhos gays, se pudessem optar, escolheriam a homossexualidade ou uma vida dita como normal? 

Entre mortos e feridos, gradualmente, o choque de realidade daqueles que não foram educados para entender a homossexualidade vai se apaziguando, trazendo luz e entendimento por meio do chamado amor incondicional. Como deixar de amar um filho ou filha mesmo que ele seja gay ou lésbica? Ainda que haja pais que prefiram ter filhos ladrões a homossexuais. "Minha mãe hoje aceita, me respeita, e ainda recebe minhas namoradas em casa. No início não foi fácil, mas valeu a pena." - contou uma amiga gay.

E, por fim, a chamada Geração Y, que ao meu ver nasce desprovida de preconceitos e disposta a viver de forma mais fácil. Conheço diversos adolescentes, conscientes de si, que apenas apresentaram seus namorados e namoradas aos pais e a família de forma simples e direta. "Aceita mãe que dói menos!" - disse uma delas. "Pai sou gay. Me passa o café." - falou outro. Aos pais, restou dar o primeiro passo rumo a novos aprendizados. 

A escala dessas gerações mostra uma mudança de comportamento que pode nos conduzir para uma sociedade capaz de respeitar e conviver de forma harmônica com as diferenças. Sinceramente, espero que a cada dia mais pessoas possam deixar de viver sua sexualidade na clandestinidade, abandonando a vida claustrofóbica dentro dos armários. Creio que este é um lampejo de luz, quase uma nova Renascença, em meio ao período sombrio que vivemos e convivemos com tantos boçais bolsonaros.

Silas Macedo

sábado, 4 de abril de 2015

Bora Malhar o Judas

Vamos malhar o Judas! Porque hoje é sábado de Aleluia! Era esse convite que recebi durante anos de minha infância no dia que antecedia a Páscoa. Acordava em meio a empolgação de buscar trapos, sapatos e roupas velhas para ajudar na confecção no boneco de Judas Iscariot - o traidor de Jesus Cristo, que se suicidou. A criançada toda se reunia e aguardava ansiosamente para bater no traidor do salvador. Me lembro que havia competições entre ruas e bairros para saber qual era o melhor Judas. E, pontualmente, ao meio dia começavam as pauladas, chutes, xingamentos e, por fim, atear fogo ao que sobrava.

Foto: Michelle Farias \ G1
Quando pequeno participava da farra, sem entender ao certo o motivo para o linchamento, acredito que devido a bagunça da criançada. Porém, as vezes que questionei o real motivo de malhar o Judas, recebia respostas enfáticas afirmando que assim que deveriam ser tratados os traidores, ainda mais o de Jesus. E reforçado pelos ensinamentos ingênuos e cheios de fé de minha avó, envoltos a dogmas católicos, "aceitei" aquele rito popular.

O tempo passou e, hoje recordei com saudosismo dessa ápoca, buscando notícias se ainda malhavam o Judas por este enorme País. Para minha surpresa, a brincadeira acontece nos dias de hoje. Uma tradição forte nas cidades do interior do Brasil, mas que aconteceu também nas capitais como protesto, dando rosto de políticos brasileiros aos bonecos.

O que questiono aqui não é a tradição popular, mas os valores por trás da ação. Incentivar e ensinar que deve-se linchar e matar alguém, independente do motivo, é algo que me assusta. Há quem defenda que se trata apenas de uma brincadeira, uma catarse coletiva, ou que estou intelectualizando o assunto. Mas, sinceramente, vejo aí uma forma de incitação a violência. Principalmente porque a maioria das pessoas, neste caso como crianças e jovens, não tem a natureza de questionar o que aprendem, e outras têm impulsos e desejos de  violência e barbárie motivados por frustrações e motivos diversos.

Uma criança pode no futuro se tornar um homem violento e defender que atos de violência sejam considerados normais por causa da malhação do Judas? Não acredito que haja essa interferência direta, mas que ela possa potencializar tendências já existentes nesse ser humano. Além disso, será que devemos mesmo malhar o Judas no dia que antecede a Páscoa? Um período de reflexão, renovação e perdão? A maioria das religiões cristãs pregam que Deus é amor e perdoa os pecados da humanidade, e ensinou por meio de seu primogênito que devemos amar e perdoar o próximo, inclusive nossos inimigos. Então por que malhar o Judas?

Partindo desta pergunta, é necessário questionar quais ensinamentos queremos transmitir aos nossos sucessores. Diretrizes que os ajudem a se tornar pessoas conscientes, seres pensantes, capazes de compreender o próximo e discernir o real motivo das coisas antes de tomar uma atitude impensada? Ou vamos preferir que eles continuem repetindo atos de barbárie que há tempos deveriam ter sidos extinguidos da humanidade?

Prefiro optar que devemos malhar velhos conceitos e renascer na páscoa do esclarecimento e mudança de atitudes.

Silas Macedo

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Maternidade à loucura

Há dias que devemos ficar atentos sobre assuntos e situações do cotidiano que trazem mensagens que nos remetem a uma reflexão. Tudo começou com uma notícia no rádio pela manhã que relatava sobre um recém-nascido que foi encontrado por um pedreiro em um cemitério da cidade de Lages, em Santa Catarina. Ao ouvir a notícia, imediatamente lembrei da vez que fiz uma reportagem onde um bebê foi encontrado em um bairro de Guarulhos em uma lixeira pelos coletores de lixo pouco antes de lançarem os desejos no caminhão, fato que poupo a vida da criança. 

No momento em questionei os motivos que levam uma mãe a desejar a morte do próprio filho, rompendo com as leis do sangue e do amor incondicional, a repórter Rachel Sheherazade - a quem tenho grande admiração profissional - que dava a notícia também questionou o fato e demonstrou claramente sua revolta. Ela fez questão de citar que mesmo nos casos de depressão pós parto - cujo fato da mãe querer matar o filho é algo normal, sensação causada pelas mudanças causadas pela maternidade - atos de violência ou infanticídio não são tolerados. Particularmente, acredito que essa explicação comportamental ajuda a compreender, mas não justificar barbáries desse tipo.

A jornalista lembrou ainda que no período do Brasil colônia existia a "Roda dos Expostos", local que funcionava em conventos e hospitais para abrigar crianças rejeitadas pelas mães. Fato histórico que nos faz recordar que a adoção é um ato de amor, dando a oportunidade de vida a criança. E que sentimentos acometem um mãe que esquece da possibilidade de adoção? Decidindo pela morte do ser que gerou.

No mesmo dia foi noticiado no Jornal Hoje (JH) da Rede Globo a reportagem sobre o número crescente de pessoas que desaparecem por ano no Brasil, e o trabalho realizado pelo projeto "Mães da Sé" - criado por uma mãe que teve a filha desaparecida - que ajuda na localização dos desaparecidos. Impossível não lembrar de uma reportagem cujo tema me permitiu entrevistar uma mãe que há anos procura o filho e, desde então deixa o quarto do desaparecido intacto na esperança do regresso dele. Que esperança e amor incondicional é esse que nutre a esperança de mães que sonham com o reencontro com seus filhos?

No início da noite, minhas indagações tiveram um exemplo dos sentimentos gerados pela maternidade, quiça o tal amor, ao ser abordado por uma mulher bem vestida, aparentando pouco mais de cinquenta anos, e uma boa condição financeira, que buscava encontrar o filho. Ela me abordou educadamente, pedindo informações sobre um suposto homem. Após alguns minutos de papo confuso, percebi nitidamente o desiquilíbrio emocional e psicológico daquela mulher. Lhe dediquei a atenção devida, mas ela decidiu ir embora.
Amor de mãe - Quais o limites entre loucura e sanidade?

Mas para minha surpresa, ela voltou para falar comigo devido a confiança devotada a mim. Aquela mãe estava com papéis com cópias da imagem de um homem negro - Barack Obama - que ela descrevia ser seu filho. "Meu filho deve ter hoje a idade deste homem bonito. O pai dele era negro, olhe as semelhanças nos traços da boca e o nariz dele. São iguais aos meus", afirmava. Quem olhava de longe, de forma superficial e desatenta, poderia achar a situação engraçada. Eu mesmo inicialmente tive vontade de rir, mas ao ver nos olhos daquela mulher o desejo insano de encontrar o filho, me enchi de compaixão.

Ouvi atento o relato que ela explicava que o filho foi retirado dela há anos pelo antigo companheiro. E que ela ainda o encontraria - mesmo que idealizado - até o final da vida. Só pude concordar e desejar a ela que de alguma forma seus anseios se concretizassem. Após o desabafo, ela se despediu, pegou suas malas e se misturou as muitas pessoas que transitam pelo Aeroporto Internacional de Guarulhos.

Inevitável não tentar entender os sentimentos que permeiam o universo da maternidade, desde o desejo de morte da cria, a esperança de encontrar o filho perdido, até o chamado amor incondicional. 

Talvez só as próprias mães, ou nem mesmo elas tenham total consciência dos caminhos tênues da maternidade à loucura. 

Silas Macedo

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Deficiência de que?

Esses dias fui surpreendido por uma situação delicada em relação a uma pessoa deficiente com mobilidade reduzida. Estava com uma amiga - vale ressaltar bem humana, respeitosa e consciente – em pleno Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, quando caminhando pelo saguão, ela resolveu usar o banheiro.

Eu fui ao banheiro masculino, e na sequência fui aguardá-la na porta do feminino, quando me deparei com uma cadeirante, simpática, com aparente trinta anos, que esperava para usar o sanitário para portadores de deficiência ou mobilidade reduzida.

Aguardei minha amiga e, para minha surpresa, ela saiu do banheiro reservado aos deficientes. Logo perguntei, e fui esclarecido que ela optou por usar aquele banheiro porque o coletivo estava lotado. Algumas risadas, até quando a cadeirante começou a proferir palavras agressivas, afirmando que minha amiga havia desrespeitado o direito dos cadeirantes em usar um banheiro exclusivo.

Símbolo Internacional de Acesso
Ficamos atônitos e perplexos com a avalanche de ataques. Nossa reação foi imediatamente pedir desculpas, e logo explicar a situação. Mas ainda sim ela repetia insistentemente o mesmo discurso: “Você acha que é melhor do que eu? Que pode usar o banheiro dos deficientes? Quem você pensa que é para me privar desse direito?”

Fiquei tranquilo, tentei acalmar os ânimos e explicar novamente o ocorrido, mas ela apenas repetia as mesmas palavras, se recusando a ouvir. Nitidamente vi um ser humano frustrado tentando projetar, justificar ou apaziguar suas frustrações as lançando em nós. Sem dúvida,  uma válvula de escape!

Sinceramente, entendo que há situações que uso do banheiro exclusivo não deva ser usado, por exemplo quando o cidadão usa o sanitário para deficientes pelo simples fato de dispor de mais espaço e permitir fazer qualquer coisa nele, desde se maquiar ou namorar.

Mas auto lá! Tudo é questão de bom senso, já que minha amiga usou o sanitário por nos máximo três minutos. Alguns municípios não têm uma legislação específica sobre o tema, mas a questão é que esses banheiros podem ser usados por qualquer cidadão na falta de um portador de deficiência. Assim como os assentos nos coletivos reservados para gestantes, idosos e deficientes.

A pauta deste incidente remete a reflexão sobre o uso desses direitos, englobando bom senso e respeito ao próximo, mas também a reação das pessoas. Neste caso, a cadeirante poderia ter reclamado ou informado educadamente a necessidade do uso exclusivo do banheiro, mas ela preferiu lançar suas frustrações no próximo. Fato que fez com que eu e minha amiga nos afastássemos. Nós reservando de receber o peso da frustração dela, mesmo porque ela seria incapaz de ouvir qualquer argumento ou desculpas naquele momento.

Finalizo questionando: Deficiência de que? Bom senso? Educação? Falta de informação? Empatia? Ou apenas deficiência física? 

Silas Macedo